Segundo autores da psicologia, não podemos falar da constituição psíquica sem nos referimos ao outro, ao social. Esses mesmos autores questionam se é possível atender aos quesitos necessários ao desenvolvimento emocional saudável de uma criança, dentro de uma instituição de acolhimento, devido a grande circulação de cuidadores e a inconstância do vínculo afetivo no dia a dia das crianças abrigadas. Pois, a situação de abrigamento reforça a instabilidade vivida que caracteriza o próprio abrigamento.
A criança no abrigo
Em alguns momentos o abrigo é capaz de suprir os cuidados que uma criança abandonada precisa, como em situação de violência ou em caso de perda dos pais e família. Porém, a permanência ao longo de muitos anos nessa instituição, que não favorece a individualidade das crianças, pode ser prejudicial à saúde emocional. Pois, muitos usam as mesmas roupas, dormem em quartos divididos por faixa etária, o que faz com que conforme crescem mudem de quarto, e também fiquem separados de irmãos de idades diferentes.
Estudiosos do assunto afirmam que os laços familiares são mais efetivos em oferecer à criança meios para sua construção psíquica do que as instituições de abrigamento, e que apesar do trauma sofrido quando há separação da família, este pode ser amenizado em casos de encaminhamento para outra família, do que em casos de permanência no abrigo, onde este pode ser agravado.
O desamparo
Altoé relata a questão do desamparo, citando Freud. Segundo esta autora, apud Freud, “o desamparo se refere à dependência de outra pessoa para sua autopreservação, como acontece com um o bebê humano ao nascer”. E não somente ao fato de suprir necessidades físicas, mas também se refere à introdução da criança na ordem simbólica, que se relaciona com a função da comunicação. O homem, por ser permeado pela linguagem, inventa formas de se relacionar com o mundo em situações de desamparo. É através das primeiras relações que a criança estabelece uma maneira de lidar com o mundo e as pessoas ao redor.
O desamparo vivido pelas crianças abrigadas está relacionado à desestruturação de suas famílias, que também vivem em situação de desestruturação social. Assim, nos abrigos, devido a precariedade dessas instituições, elas sofrem a ação do Estado, que “visa” sua proteção, mas que repete de forma traumática essa desestruturação social. Por isso, defende o Estatuto da criança e do Adolescente, que toda criança deve viver no seio de uma família, e não em uma instituição.