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Estudo chinês sugere que covid-19 pode gerar infertilidade masculina

Por Francine Costanti 15/05/2020

Um estudo chinês sugeriu que o covid-19 pode gerar infertilidade masculina. Feita pelo Departamento de Urologia do Hospital de Nanjing em conjunto com a Escola de Enfermagem do Suzhou Vocational Health and Technical College, a pesquisa mostrou que homens infectados pelo vírus podem apresentar quadros de infertilidade, isto é, o vírus atinge diretamente o sistema reprodutivo. Além disso, traz riscos para o sistema urinário masculino. 

“Há indícios de que o coronavírus possa infectar outras células do organismo por meio do receptor ACE2, como células dos rins e dos testículos. Dependendo do efeito que a infecção destas células pode causar, existe a possibilidade de sequelas também nestes órgãos”, explica Dr. Sérgio Pereira Gonçalves, médico especialista em reprodução humana da Clínica Viventre. 

Problemas testiculares 

De acordo com Dr. Sérgio, foi demonstrado que o receptor ECA2 está presente tanto em células dos túbulos seminíferos (onde os espermatozoides se desenvolvem), quando nas células de Leydig, que são responsáveis pela produção hormonal (testosterona). 

Quando um tecido é infectado, seja por vírus ou bactérias, desenvolve-se um processo inflamatório. Esta inflamação consiste na ação de células do sistema de defesa do organismo, como os leucócitos, que produzem uma série de substâncias para combater o agente agressor. 

“O problema é que a ‘guerra’ contra o invasor acaba muitas vezes por lesar também células do tecido acometido. O resultado é que muitas delas são perdidas. Dependendo o grau de lesão, a função do órgão pode ser comprometida”, comenta. 

Na inflamação dos testículos (orquite), o acometimento e lesão celular poderia, portanto, resultar em comprometimento da função reprodutiva e hormonal (que são as funções primordiais dos testículos).

Homens afetados pelo coronavírus podem apresentar sequelas no órgão sexual,, sugere estudo chinês. Foto: iStock

Como a enzima ACE2 afeta os órgãos 

A ACE2 (sigla em inglês para enzima conversora da angiotensina-2) participa do chamado sistema renina-angiotensina-aldosterona, fundamental para a manutenção da pressão arterial por meio da produção de substâncias vasoconstritoras (como a angiotensina), além do balanço de água e de eletrólitos, como o sódio. Uma vez que o coronavírus usa o ACE2 da membrana das células como “porta” para infectá-las, tecidos com alta expressão de ACE2 são particularmente vulneráveis ao vírus.

Doenças virais x problemas testiculares 

Geralmente doenças virais costumam causar inflamação testicular e, dependendo do avanço do caso, podem até levar à atrofia do órgão ou infertilidade. Além do coronavírus, há outros vírus que podem levar a inflamação dos testículos (orquite), como o vírus da caxumba, da hepatite B e o HIV. Dr. Sérgio alerta que, dependendo do grau de acometimento, a função do órgão pode ser comprometida. 

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Dor ao urinar

A dor ao urinar costuma se associar a infecção do trato urinário. Geralmente tem origem bacteriana e é tratada com antibióticos. A inflamação nos testículos (orquite) costuma causar aumento da sensibilidade, dor e eventualmente aumento de volume do saco escrotal. 

Dr. Sérgio orienta para que sempre que perceber algum destes sinais ou sintomas, o homem deve procurar o médico. “É importante lembrar que, além de inflamações de origem viral, tumores testiculares podem causar sintomas semelhantes, sendo importantíssima a avaliação médica”, complementa. 

Diagnóstico 

O primeiro passo para qualquer diagnóstico é uma história clínica detalhada e exame físico. Problemas do trato urinário costumam ser avaliados por exames de urina (como a urina I e a urocultura) e exames de imagem, como a ultrassonografia de vias urinárias, tomografia, ressonância e cistoscopia (avaliação direta da bexiga com o uso de uma microcâmera). A indicação destes exames dependerá muito do sintoma apresentado. 

Homens com história de infertilidade devem ser submetidos a espermograma e ultrassom dos testículos. Dependendo das alterações encontradas, outros exames poderão ser solicitados, como exames genéticos, por exemplo. É importante lembrar que a avaliação masculina é fundamental para casais com história de infertilidade, ou seja, tentando a gravidez, sem sucesso, por 1 ano ou mais. 

Principais medidas a tomar 

Dr. Sérgio aconselha que, após curado da covid-19, caso homem tenha apresentado quadro clínico de orquite (inflamação testicular), deve aguardar 3 meses para avaliação da amostra do sêmen (espermograma). “Não existem recomendações formais de que este exame deve ser feito de rotina para homens infectados por coronavírus sem história de orquite ou infertilidade na evolução do quadro. Portanto, caso haja dificuldade para engravidar após a infecção, o casal deverá passar pelos mesmo exames de investigação indicados para qualquer outro casal infértil”, diz. 

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É preciso mais estudos  

A pesquisa chinesa apresenta o modelo pelo qual existe risco de acometimento testicular pelo SARS-Cov-2 (coronavírus), isto é, a presença de grande quantidade de ACE2 em células dos testículos. Porém, o especialista ressalta que esses dados servem como alerta, mas não como motivo para pânico.

“Não há dados ainda que comprovam aumento de infertilidade em homens acometidos pela covid-19, mas deve-se dar atenção especial àqueles pacientes com quadro clínico de inflamação testicular durante a doença”, conclui.