Saúde Mental

Nós e a relação entre ser e ter

Por Bruno Cuiabano 17/02/2014

Atualmente, é difícil definir as relações que estabelecemos com os outros, com as coisas que possuímos e, principalmente, com nós mesmos. Isso está ligado à diferença entre ser e ter.

 

ser e ter

Cada vez mais, através do modelo de relações apresentado pela mídia e o consumo desenfreado, vivemos a realidade de que o ser está reduzido ao ter. Podemos concluir, dizendo de outra forma, que o “ser” hoje está reduzido ao não-ser. O “ter” enfoca as atividades do mundo externo e se reduz ao que possuímos: propriedades e dinheiro ou a fenômenos sociais associados ao nosso ego e que nos trazem segurança como status e fama.

O “ser” enfoca nas atividades do mundo interno e está associado respectivamente ao nosso corpo e as experiências afetivas que vivemos. Quando o objetivo é secundário a ação, estamos mais próximos das intenções voltadas a nossas sensações, na qual predominam o prazer e a motivação. Essa distinção tem cunho mais didático, para que possamos inicialmente diferenciar as nossas intenções. Mas, precisamos levar em consideração que essa separação do interno com o externo tem menos sentido a partir do momento em que vamos nos apropriando de nossas sensações e sentimentos.

Ser e sentir estão correlacionados. Uma sensação surge espontaneamente e não existem objetos ou metas que nos norteiam. Podemos apresentar razões ao que sentimos, mas essas sensações não surgem em resposta aos ditames de nossa razão. Frequentemente contrapõe-se à mesma e mais uma vez lutamos para controlá-las, no caso colocá-las “debaixo do tapete”. O modo possessivo reduz o ser (o que possuímos nos possui). Buscamos liberdade através de fortunas e a perdemos na busca, o homem não se contenta em simplesmente existir, ele tem que fazer algo, alcançar uma meta, um objetivo material. A pós-modernidade tem nos ensinado a cultura da glória acima de qualquer coisa e a cultura das armas e da guerra, que geram a nossa própria destruição.

O modo de viver entre o ser e ter, no qual o primeiro tem mais importância e não se integrando com o outro, nos coloca numa prisão. Aferrando-se ao que temos, esquecemo-nos de nossa liberdade, que se fundamenta no amar, no dar e no compartilhar. Essas mesmas qualidades incidem sobre a comunidade e não somente sobre o indivíduo, pelo fato de que ela advém de uma responsabilidade com o meio em que vivemos. A luta para mudar o nosso ser nos enreda mais profundamente no destino que estamos tentando evitar. Neste caso, na relação entre ser e ter, acabamos por lutar contra a nossa auto aceitação.

Entre ser e ter

ser e ter
Os papeis que adotamos em nossa vida se tornam estruturados no nosso corpo, mudamos nosso corpo segundo a imagem que nosso ego deseja criar. Têm-se medo de ser (medo da vida). Podemos mascarar esse medo aumentando nosso fazer, quanto mais ocupados ficamos, menos tempo temos para sentir, ser e viver. Podemos mensurar nossa vida pelo que temos ou pela qualidade de nossas relações e a plenitude de nossas experiências. O ritmo frenético da vida moderna é um sinal do medo inconsciente de todos do ser. Enquanto esse medo persistir nós correremos cada vez mais rápido a fim de escondermos esse medo.

Isso é especialmente verdadeiro dentro de um processo educacional, onde pode ser trabalhada a relação entre ser e ter. A ênfase sobre os resultados finais e a falta de interesse pelos sentimentos e sensações tornam a criança resistente à escola, ela sente que seu ser está sendo negado pelo seu ambiente. A realidade em que vivemos ininterruptamente nega nosso ser, no entanto adultos tem uma estrutura mais fortalecida para aceitar as contradições e tensões do sistema, no entanto a duras penas.

Uma vez relacionado ao sentir, estamos abertos a movimentos e gestos auto expressivos, ou seja, diretamente ligados a nossa natureza e a uma força de vida que todos os humanos têm. O movimento psíquico gerado é de integração com o ego e não luta ou fuga dele. Uma pessoa saudável responde de maneira harmoniosa demonstrando equilíbrio entre ser e ter ou fazer, sentir e pensar, espontaneidade e respostas deliberadas. Harmonia entre ego e corpo.

Não existe dicotomia entre ser e fazer, eles são os dois lados da experiência da nossa relação com o mundo e com as pessoas, mas em ultima instancia, o ser e o fazer fazem parte de uma mesma realidade que nos leva mais a uma integração, a um saber-agir. A harmonia de resposta ao ambiente vai ao caminho contrario a reação ou a atuação, a pura catarse pela catarse. A ilusória contradição entre espontaneidade e controle dos movimentos se esvai pelo fato de que a combinação entre eles gera movimentos integrados, elegantes e graciosos.

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