Aumentar o desempenho intelectual, ter mais disposição para estudar e melhorar a atuação no trabalho. Essas razões levam profissionais e estudantes ao consumo de smart drugs – algo que já é tendência. São psicoestimulantes que prometem aperfeiçoamento cognitivo, mesmo em pessoas que não apresentam problemas psiquiátricos e neurológicos.
Entretanto, quem consome está sujeito a riscos e efeitos colaterais.
O que são smart drugs
As smart drugs são pílulas indicadas para quem apresenta problemas como déficit de atenção, mal de Alzheimeir e hiperatividade.
“São medicamentos que passaram a ser empregados com outros fins”, explica o psiquiatra Pedro Ferreira, professor da Faculdade de Medicina da PUC-RS e coordenador do Ambulatório de Dependência Química do Hospital São Lucas da PUCRS. No Brasil, a utilização das “medicações inteligentes” entre os jovens se torna cada vez mais comum.
Diferentes substâncias são rotuladas como smart drugs: modafinil, metilfenidato, pirodina-acetanida e ritalina, por exemplo. “A preferida entre os estudantes é o metilfenidato, empregado no tratamento de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH)”, observa o psiquiatra.
Ferreira menciona que o consumo é feito de forma off-label, diferente do que é orientado na bula, para um aprimoramento cognitivo. “Essas medicações supostamente melhorariam as funções cognitivas: memória, capacidade de focar e sustentar a atenção por um tempo adequado e a orientação tempo/espaço/pessoa”, esclarece o psiquiatra.
De acordo com ele, essas funções psíquicas estão intimamente relacionadas à aprendizagem e às funções executivas, como a capacidade de tomar decisões, executar e finalizar tarefas. “Em um mundo competitivo como o nosso, para um número crescente de pessoas, o seu incremento se torna atraente”, pontua.
Mas como essas medicações afetam o organismo? Ferreira afirma que, de um modo geral, agem em sistemas de neurotransmissores envolvidos com as funções cognitivas, executivas e o sistema de gratificação cerebral. “Em alguns relatos, há constatações de melhoria no aprendizado e capacidade intelectual e de controlar o cansaço e o sono excessivos durante o dia”, diz.
Quando são indicadas?
Embora o uso seja cada vez mais acentuado, as smart drugs são indicadas para psicopatologias envolvendo déficits cognitivos. Entre elas, TDAH, estados demenciais ou patologias que comprometem as funções cerebrais e alteram as cognitivas, conforme explica o psiquiatra.
“Os benefícios vão desde uma melhoria na vida acadêmica, familiar e sócio-ocupacional nas pessoas que apresentam patologias envolvendo disfunção executiva até, em alguns casos, aprimoramento no sistema atencional e no desempenho intelectual mesmo em indivíduos saudáveis”, diz Ferreira.
Entretanto, o uso por pessoas que não têm real necessidade envolve perigo. Segundo o psiquiatra, o grande risco da prescrição off-label resulta com frequência da inexperiência de quem a recomenda.
“Muitos dos sistemas neurotransmissores que conhecemos e que estão ligados à memória, aprendizado e sensação de gratificação, além da diminuição da sensação de cansaço físico e mental também participam de outros processos mentais”, salienta Ferreira.
Por isso, o uso pode agir sobre outras funções. É o que explica o psiquiatra: “Esse tipo de medicação, visando melhorar artificialmente a cognição, aprendizado e gratificação, poderá afetar outras funções cerebrais, com efeitos imprevisíveis”, alerta. Ferreira menciona uma das consequências é o desencadeamento de psicopatologias que estavam em estado latente.
Nesse rol, entram psicopatologias como transtorno do humor bipolar, psicose, tiques nervosos, além de acne, cefaleia, anorexia e diminuição do crescimento na infância. Alguns medicamentos podem causar dependência.
Dilema ético
O debate sobre smart drugs é rondado por questões éticas na comunidade científica: o consumo dessas substâncias para melhorar o desempenho em um concurso ou a atuação profissional pode ser caracterizado como doping?
“Um dos questionamentos se baseia na possibilidade de o emprego das substâncias agravar as desigualdades sociais. Ou, pelo contrário, elas não poderiam proporcionar uma ‘compensação’ para quem não teve bom desempenho na escola ou em concursos por conta de desigualdades sociais, reduzida inteligência, menor capacidade de memorizar ou de manter a atenção?”, indaga Ferreira.
Para ele, pesquisa e produção de smart drugs seguras e eficazes devem se intensificar nos próximos anos. “Mas as questões sobre a ética do aprimoramento cognitivo já começa a ser discutida pela comunidade científica e imprensa internacional”, afirma.
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