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Correndo atrás de carrinhos de bebê, por Mariana Parreiras

Por Redação Doutíssima 23/03/2015

Emagrecer após a gravidez é o desejo entre dez em cada dez mulheres. Mas muitos são os desafios para entrar em forma depois do parto. A nossa colunista Mariana Parreiras foi em busca da silhueta perdida, e, mesmo com todas as dificuldades, descobriu na atividade física a melhor maneira de se relacionar com o corpo e com o mundo. A meta era perder 10 quilos e vencer os obstáculos de se exercitar em meio aos carrinhos de bebê! Será que ela conseguiu?

 

carrinho de bebê

Mães malhando com os bebês na Califórnia. Foto: Arquivo pessoal.

A manhã no sul da Califórnia é o que se espera: o cais está ocupado de pescadores mexicanos e asiáticos e cheira a peixe, o mar está repleto de surfistas, muitos de meia idade, e às vezes são visitados por golfinhos e leões marinhos, ou mesmo baleias, à distância.

 

Na praia, a maior competição está entre os personal trainers para tomar posse dos melhores pontos para seus exercícios em grupo que vão de algumas pessoas a dezenas de alunos. A rua principal, ao longo da areia, é praticamente fechada à passagem de carros para que o trânsito seja apenas de bicicletas e corredores. É mesmo uma cidade voltada para a atividade física.

 

Em tal ambiente, nem os carrinhos de bebê são normais. Eles têm rodas maiores, para todo tipo de terreno e são leves, e eles passam rápido, porque essas mães tem pressa. Fiz parte de um grupo de mulheres que correm e malham com esse tipo de carrinhos por alguns anos.

 

Elas se tornaram para mim uma família e amigas para toda a vida. Nos nos reuníamos em praias e praças, normalmente com vistas fantásticas do mar e só parávamos as aulas por dois motivos de muita importância: um bebê leão marinho perdido na areia ou um surfista gostoso saindo do mar.

 

Nós nos reuníamos também em datas especiais, feriados, aniversários, e pelo menos uma vez por mês para sair de noite, sem maridos, sem criança, sem carrinho de bebê. Durante a aula, crianças chorando ou querendo mamar nunca impediram a fluidez das sessões continuarem. Revezávamos entre olhar e entreter as crianças e muitas amarravam os bebês no peito com uma faixa para que os mesmos mamassem enquanto as mães continuavam a malhar.

 

Exagero? Não. Califórnia. Aqui vai o meu diário da primeira marcante (e dolorosa) experiência com este grupo. Minhas mãos ainda estão tremendo. Me sinto como se tivesse sido atropelada por um caminhão depois de ter levado pauladas. Até o meu cabelo parece que dói. Retornei, a algumas horas atrás, da minha primeira aula de ginástica com carrinhos de bebê.

 

Encontrei o grupo na internet enquanto procurava alternativas para malhar com crianças. Eu imaginava encontrar mulheres com excesso de peso que apenas se encontram com seus carrinhos para beberem seus cafés enquanto falavam de fraldas. Depois desta suposta aula de ginástica, pensei comigo, ainda devem ir comer bomba de chocolate.

 

Conclui, mesmo assim, que tudo bem, eu posso ir tomar um café, conversar sobre fraldas e comer bomba de chocolate. Isso é o que a minha triste realidade veio a se tornar, de qualquer maneira. Eu nem levei comigo qualquer água, porque tinha certeza de que apenas faríamos alguns polichinelos seguidos de exercícios com alguns elásticos tolos, sem qualquer efeito colateral.

 

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Malhação ao ar livre com carrinhos de bebê. Foto: Arquivo pessoal.

 

Chego a um ponto de encontro perto do cais, onde vinte e pouco mamães se reúnem antes de começar a aula. Quando chego com o meu carrinho padrão noto que cada um dos bebês, sem exceção, se aconchegam dentro de carrinhos de corrida do tamanho de um fusca. Noto também que muitos dos bebês estão usando óculos escuros e que suas mães são… magras.

 

Elas balançam seus cabelos loiros perfeitos pelo vento ao alongar seus corpos atléticos, e é quase como se estivessem em câmera lenta, como em um filme. Eu me sinto como a nova garota sem graça na escola. Até seus bebês se conhecem uns aos outros e parecem se cumprimentarem, por detrás de seus óculos escuros.

 

Pergunto à linda, musculosa, e magra mãe-professora se vou ser capaz de manter o ritmo do grupo quando não tenho um carrinho próprio de corrida. Ela diz que não faz tanta diferença. Mentirosa.

 

Uma moça grávida chega e minha intimidação por estas mulheres diminui um pouco. Se esta grávida pode fazer esta aula, o meu grande traseiro também pode. A moça grávida me diz em uma breve conversa onde nos apresentamos, no entanto, que ela está de trinta e oito semanas de gravidez e eu concluo que ela é uma aberração da natureza, porque às trinta e oito semanas de gravidez a única corrida que fiz foi do sofá para o banheiro.

 

Musculosa e magra mãe-professora me pergunta se eu me exercitei antes da gravidez e eu faço o enorme erro em lhe informar (de maneira um tanto presunçosa e de peito cheio, diga-se de passagem) que eu fui personal trainer por muitos anos e a dez quilos atrás.

 

Ela me passa um elástico de exercício de cor verde e eu quero dizer-lhe que a cor verde é muito leve, mas decidi manter o meu ego em cheque e tentar não aparecer muito com todo esse meu grande conhecimento sobre exercício físico. Não quero humilhar ninguém, não é?

 

Vinte minutos mais tarde e estamos subindo uma colina extremamente íngreme, enquanto empurramos os carrinhos de bebê e agachamos entre os passos, e depois de correr o mais rápido possível por um quilômetro sem parar. Eu estou sem ar. A moça grávida já me passou.

 

A desgraçada da musculosa e magra mãe-professora diz: “Vamos lá, Mariana! Você pode agachar mais baixo do que isso!” Por que ela acha que Mariana pode agachar mais baixo do que isso? Ah, sim, porque a burra da Mariana teve que abrir sua grande boca gorda e dizer que ela era personal trainer.

 

Agora corremos novamente e meu gps do telefone diz que este já é o quinto quilômetro que percorremos. Meu filho está gritando de alegria dentro do carrinho. O sol está fritando meus neurônios restantes da maternidade. Estou com tanta sede que eu me pergunto se beber a mamadeira do meu bebê seria tão má idéia e se isso seria considerado canibalismo, já que o leite veio dos meus próprios seios.

 

Falando nisso, o sutiã que estou usando não é muito bacana para exercícios aeróbios, e por isso estou segurando meus seios enquanto fazemos polichinelo por algumas centenas de milhões de vezes. Quando é a parte onde vamos comer bomba de chocolate?

 

Essa professora insuportável e magricela (alguém por favor dá um hambúrguer para ela?) agora nos manda correr uma rua abaixo e voltar saltando de lado. Neste ponto já tínhamos corrido por toda santa Califórnia e feito exercícios locais com o tolo elástico verde (que acabou por não ser nada de tolo, já que meus braços estão agora a fazer espasmos involuntários), por uma eternidade. Eu achei que iria cair dura e literalmente gritei, sem pensar antes de falar, “Você está louca? Bebeu?”

 

As outras mães riem pois acham que eu estou apenas fazendo graça, mas eu não acho graça nenhuma. Descemos e subimos essa maldita rua mais um milhão de vezes. Depois fazemos ainda mais exercícios locais com os estupidamente tolos elásticos verdes na frente dos bebês enquanto cantamos músicas de ninar, o que é muito diferente do Metallica que eu costumo ouvir quando neste tipo de dor gerada pelo exercício físico.

 

Eu fico esperando que o Matthew chore pedindo comida para que eu tenha a desculpa de me assentar, mas não, não hoje. Hoje é o dia em que ele não pede comida a cada dois segundos. Ao invés disso, ele sorri e acena para seus novos amigos, os outros bebês.

 

Na volta para o cais, eu corro na frente de todas desta vez, mas não porque eu quero me esforçar ou aparecer, mas porque no caso de eu cair morta, eu não ser deixada para ser comida por gaivotas na praia e meu filho ser pego pelo bicho papão. Não sei se retornarei a essa aula. Bando de malucas. Vou tomar um café enquanto decido.

 

Mariana Parreiras

Mariana Parreiras e os pequenos John e Matt. Foto: Arquivo pessoal.

 

Mãe do John e do Matthew, Mariana Parreiras, 35 anos, escreve semanalmente para a coluna “Relato de Mãe”. Num texto leve e moderno, ela conta sobre a delícia e a dor de ser mãe. Formada em comunicação e com uma carreira consolidada em grandes empresas americanas, Mariana colocou a vida profissional em segundo plano para cuidar da educação dos filhos. Acompanhe!

 

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